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Pesquisa clínica – parte 1

Entrevista sobre pesquisa clínica com a Dra. Carmela Farias da Silva, Bióloga, Nutricionista e pesquisadora. Possui mestrado e doutorado, além de quase 15 anos de experiência em pesquisa clínica, projetos, gestão de biobancos, técnicas de biologia molecular e coordenação de estudos clínicos. Trabalhou como consultora técnica de negócios em uma empresa de biotecnologia; foi analista acadêmica e supervisora de processos educacionais e responsável pela gestão administrativa do Comitê de Ética em Pesquisa em um grande hospital de Porto Alegre. Possui ampla experiência sobre ética em pesquisa com pesquisa com seres humanos. Atualmente, é coordenadora de estudo clínico na área de inteligência artificial e risco de desenvolvimento de câncer de mama e pulmão além de ser coordenadora científica de dados sênior.


O que é pesquisa clínica?

Dra. Carmela: Pesquisa clínica é a pesquisa que envolve seres humanos. Pode ser experimental, ou seja, quando existe uma intervenção, ou observacional, quando envolve dados de um grupo de indivíduos sobre uma doença ou acompanhamento de uma doença ou intervenção.  A intervenção não se limita a testar apenas efeitos de medicamentos ou equipamentos médicos, mas também pode ser sobre uma dieta ou suplemento e, também, efeitos de exercícios físicos sobre melhora de parâmetros de saúde. 


Existe um erro recorrente na divulgação cientifica em que são comunicados resultados de estudos in vitro (estudos que são realizados em laboratório) ou in vivo (estudos em animais) para afirmar que existem efeitos positivos de alguma intervenção. Na verdade, isso compõe apenas as fases iniciais de uma investigação, conhecido como estudo pré-clínico. Se os resultados desta etapa foram positivos, é necessário realizar várias fases nos estudos clínicos (com seres humanos) para confirmar os efeitos benéficos de uma intervenção. 


Quais são as fases da pesquisa clínica?

Dra. Carmela: Os primeiros estudos são chamados de pré-clínicos e são realizados em laboratório, em células e em modelos animais, conforme comentado acima. Caso existam bons resultados nesses primeiros estudos, são realizadas as quatro fases da pesquisa clínica, sequencialmente.  


Na fase 1, são recrutados um pequeno grupo de pessoas saudáveis para avaliar a tolerância e a segurança de diferentes doses de uma molécula ou produto em investigação. Nessa fase, não é correto utilizar o termo “medicamento”, pois ele ainda não está pronto para uso comercial; só será chamado de medicamento quando estiver disponibilizado para venda. 


A partir da fase 2, são recrutados em torno de 100-300 participantes com a doença de interesse e será verificada a eficácia do medicamento; ou seja, se ele funciona ou não e em que dose ele funciona. Também se avalia a farmacocinética, que a gente pode definir como “o caminho que o medicamento faz dentro do nosso corpo”. 


Na fase 3, o estudo é ampliado para ser realizado em diferentes centros de pesquisa do mundo (o que chamamos de estudo multicêntrico), com o objetivo de entender como o medicamento se comporta em diferentes populações. Nessa fase, os participantes do estudo são randomizados, isso significa que um grupo de participantes é sorteado para receber o fármaco em teste e outro grupo recebe um medicamento já existente (caso exista um padrão-ouro de tratamento, caso contrário, poderá ser utilizado placebo).


Na fase 4, que conhecemos por farmacovigilância, o medicamento já está comercialmente disponível na farmácia, mas como é um medicamento muito novo, ele fica em acompanhamento durante anos para verificar se podem acontecer efeitos adversos que não foram observados anteriormente. Isso acontece, pois, afinal, nesta etapa, o acesso ao medicamento é muito maior para diferentes pessoas e, assim, a chance de ocorrência de um evento inesperado também ganha maior proporção. Caso os eventos adversos apareçam de forma muito recorrente e se verifique relação provável com o medicamento, a venda é suspensa até que a investigação seja concluída e os esclarecimentos prestados. O caso da talidomida, por exemplo, foi uma medicação cujo os efeitos adversos graves só foram observados na fase 4 e, atualmente, é recomendado que a medicação não seja utilizada por gestantes. Qualquer pessoa que suspeite de uma associação sobre a ocorrência de efeito adverso por uso de um medicamento pode (e deve) reportar no site da ANVISA, pois esses dados são analisados e investigados continuamente (o nome do sistema é VigMed)


Realizar pesquisa clínica é bastante complexo e é um processo demorado que pode levar entre 4, 8 anos, 10 anos ou mais, pois cada fase só é realizada após obter resultados favoráveis em que os benefícios da nova medicação superam os riscos. Dessa forma, caso o estudo não apresente benefícios ou manifeste riscos graves para os participantes, o estudo pode ser suspenso.


Essas fases são diferentes para pesquisa clínica com doenças raras?

Dra. Carmela: Não, a condução das fases deve ser exatamente a mesma. A diferença é que o número de participantes será menor. Por isso, os estudos multicêntricos são importantes para aumentar a chance de recrutar mais participantes.

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